As quatro histórias são interligadas por uma poética cena em que a atriz Lillian Gish (uma das preferidas do diretor) balança um berço com um olhar desolado, simbolizando a contínua disputa entre pessoas de diferentes ideologias. Os lugares e épocas retratados são: a Babilônia da Antiguidade, a Jerusalém da época de Cristo, a França no século XVI e a era contemporânea. Destacando-se de todas está a primeira história. Os monumentais cenários construídos a mão na Sunset Boulevard em Hollywood mantiveram o recorde de tamanho por muitos anos, e a trama não fica muito atrás. Detalhando a invasão da cidade por Ciro, rei da Pérsia, tem com protagonista uma jovem rebelde (Constance Talmadge) forçada por seu irmão a se casar. Ao ser liberada do compromisso pelo bondoso príncipe Belshazzar (Alfred Paget), se torna obcecada por ele, estando disposta a defender a cidade e sua honra.
Na história da era contemporânea, Griffith volta a tratar do tema da "elevação" da sociedade, já defendida em "O Nascimento de uma Nação". Porém, dessa vez, foca naqueles que sofrem com ela, mostrando como uma organização hipócrita dedicada a esse fim afeta a vida de uma mulher (Mae Marsh) das formas mais cruéis, demitindo seu pai da fábrica onde trabalhava, junto com dezenas de funcionários em greve, e tirando seu filho de seus braços. Além disso, seu marido (Robert Harron) é preso por um crime que não cometeu e condenado à forca. Devido ao desenvolvimento de tantos acontecimentos trágicos, a história toma boa parte do tempo da película (que tem mais de 3 horas), e seus maiores méritos são as ótimas atuações e o timing preciso das cenas de ação.
No meio de tamanha exuberância de cenários e situações, sobra pouco espaço para que as outras duas histórias se desenvolvam. Em Jerusalém, acompanham-se momentos da vida de Jesus, como a transformação da água em vinho nas Bodas de Caná e sua crucificação. Entre esses dois momentos, sacerdotes conspiram contra a mensagem de amor que ele passa. Chega a ser perturbador pensar que Griffith está fazendo uma analogia à sua própria situação. Porém, por não ter um conflito e nem personagens centrais, é facilmente esquecível. Por fim, o relato da Noite de São Bartolomeu, onde milhares de protestantes foram assassinados a mando de Catherine de Medici, mãe do rei Charles IX. Apesar de curta, a cena é impactante, mostrando o desespero de uma família simples ao se ver no meio do conflito, ao mesmo tempo em que o pretendente da filha mais velha corre desesperadamente para salvá-la.
A obra-prima de Griffith é gigantesca até mesmo pelos padrões atuais. É impossível não se impressionar com a grande festa babilônica, onde o príncipe e sua amada dançam em comemoração à primeira vitória contra os persas, acompanhados por um travelling aéreo assustadoramente pioneiro. O filme tem potencial para agradar até mesmo quem não está acostumado a depender apenas de mímica e intertítulos, ainda mais se estes desconhecerem o contexto em que ele está inserido. Porém, uma prévia fascinação pelo cinema mudo aliada com uma análise da motivação do cineasta faz com que "Intolerância" recompense todo o tempo investido nele.
PS: Para quem tiver uma boa conexão, o filme está na íntegra no YouTube
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